Class, race and sex oppression.

Summary: O projeto visa à compreensão da articulação entre opressões de raça, classe e sexo. Tem-se como objetivo, neste projeto, entender como explorações de raça, sexo e classe são produzidas e reproduzidas constantemente pelo modo de produção capitalista, bem como de que maneira entrecruzam-se. Os autores e autoras trabalhados para a compreensão desta temática dentro deste projeto serão Karl Marx, Silvia Federici, Heleieth Saffioti, Angela Davis, Djamila Ribeiro, Sueli Carneiro, Lélia Gonzalez, Conceição Evaristo e Carolina Maria de Jesus, além de comentadores e comentadoras que fomentem a melhor compreensão dos referidos autores. De acordo com Silvia Federici, no livro Calibã e a Bruxa, o modo de produção capitalista foi constituído como expressão de uma contrarrevolução das classes dominantes em relação às conquistas dos trabalhadores e trabalhadoras, da Europa, do período medieval . Especialmente no final do século XIV e século XV, a classe trabalhadora europeia havia obtido grandes conquistas devido à escassez de mão de obra consequente da peste negra, bem como por conta das lutas antifeudais empreendidas ao longo de toda baixa Idade Média . Este período foi o que Marx denominou como idade de ouro da força de trabalho europeia, conforme afirma Silvia Federici (2017, p. 100), na passagem a seguir: "Efetivamente, no começo do século XV, pelo menos na Inglaterra, a servidão ou a vilanagem haviam desaparecido quase por completo (...). O que se seguiu tem sido descrito como a idade de ouro do proletariado europeu (Marx, 1909, t.I; Braudel 1967, pp.128 e segs). Tais conquistas levaram a classe dominante (composta pela burguesia nascente e pela aristocracia) a um verdadeiro desespero que fez com que se unissem na procura por mão de obra a ser explorada . Esta busca resultou nos cercamentos e expulsão do campesinato da terra, constituição, na Europa, de uma massa de mendigos, criminosos, prostitutas sem-terra e sem acesso aos meios de vida que vagavam pelas estradas e cidades à procura de algum modo de sobreviver. Para Silvia Federici, os cercamentos tinham o objetivo de expulsar camponeses e camponesas da terra não com o intuito de liberá-los, mas com a finalidade de fixá-los no trabalho mal pago, em reposta às conquistas que haviam obtido no século XV. Paralelamente, o impulso para encontrar pessoas a serem exploradas levou ao início do colonialismo, tráfico de escravos, gerando o que pode ser denominado como um verdadeiro holocausto dos povos negros e originários das Américas. Em suma: Como sabemos, a conquista, a escravização, o roubo, o assassinato: em uma palavra, a violência foi o pilar desse processo (...). (Federici, Silvia, 2017, p.116). De acordo com a autora, foram necessários mais de três séculos para controlar a força de trabalho que não desejava vender seus corpos nem mesmo diante da fome e da forca . Os esforços perpetrados com este intuito envolveram a perseguição de homens e mulheres, torturas, execuções, confinamentos nas workhouses ou casas de trabalhos forçados e a grande caça às bruxas. Tal ânsia por exploração da força de trabalho abarcou a captura e tráfico de povos da África para as Américas, bem como a opressão da população indígena. A ofensiva contra os povos africanos e indígenas envolveu inúmeras táticas de opressão como escravização para exploração de seus trabalhos, torturas, castigos, execuções e abusos sexuais de toda sorte. Além da violência física efetuada contra homens europeus e mulheres europeias com a finalidade de dominar seus corpos para o trabalho produtor de mercadorias não-humanas e humanas (no caso das mulheres), criou-se todo um conjunto de teorias e ideologias que condenavam os corpos que se contrapusessem ao trabalho. Tais teorias expressaram-se inclusive na filosofia que passava a ver o corpo como uma máquina, criando uma separação entre racionalidade e corpo, sendo que este último e tudo que dizia respeito a ele (como as paixões) deveria ser dominado pela razão . No caso dos povos africanos e indígenas, as ideologias presentes nas teorias tentavam afirmar sua dominação, expressando que tais povos seriam inferiores, com uma cultura atrasada que deveria ser substituída pela cultura dos povos dominantes. Em outras palavras, tais teorias tentavam justificar a escravização, torturas, assassinatos e abusos de todos os tipos de negros, negras e indígenas. O racismo em relação aos povos negros e indígenas foi amplamente promovido nas Américas, inclusive do ponto de vista legal , como forma de mais explorar e subjugar estes povos, bem como maneira de quebrar qualquer possibilidade de união entre brancos pobres, negros e indígenas . Este empreendimento de tentativa de dominação e domesticação dos corpos para o trabalho diretamente produtor de mercadorias não-humanas, para o trabalho de geração e cuidado de pessoas e escravização dos povos africanos e ameríndios constituiu o processo denominado, por Federici, de acumulação primitiva que está na base da constituição do modo de produção capitalista. O capitalismo ergueu-se, portanto, como um modo de produção pautado em opressões de classe, raça e gênero, como forma de acumular trabalho . A opressão de classe se dá pela formação de uma massa de trabalhadores e trabalhadoras que não possuem nada para vender além de sua força de trabalho, sendo que sempre ganham salários menores do que aquilo que contribuem para a produção. Do ponto de vista das mulheres , a situação é ainda pior, porque neste processo de acumulação primitiva, foram privadas do controle sobre seus corpos, pela criminalização de saberes e métodos contraceptivos que possuíam. As mulheres foram submetidas a uma nova ordem patriarcal, sob o mando do capital, em que seus corpos foram colocados a serviço da reprodução e do cuidado de gente, trabalho este efetuado sem nenhuma remuneração. Quando elas conseguem um trabalho remunerado fora de casa, o sexismo existente faz com que recebam remunerações menores do que as dos homens, nas mesmas funções, e que continuem com a incumbência de cuidar dos filhos e da casa. Do ponto de vista dos povos africanos e indígenas escravizados foi perpetrado um verdadeiro genocídio e desumanização de seus corpos com vistas à extração mais espúria de seus trabalhos. Pode-se depreender do que foi ressaltado que se criou um sistema de exploração e divisão dentro da imensa maioria subjugada que compunha a força de trabalho . Dentre todos os explorados, os homens brancos estão acima das mulheres brancas, de trabalhadores negros, negras e indígenas, pois apesar de serem assalariados e terem o excedente de seu trabalho usurpado na forma de mais-valor, estão inseridos em uma cultura patriarcal que lhes dá primado de mando dentro de casa, sobre seus filhos e suas esposas, aproveitando-se de uma condição que, na maioria das vezes, os exime de fazer trabalhos domésticos e de cuidados com seus filhos . Mulheres brancas viriam logo abaixo dos homens brancos na pirâmide de exploração, tendo dificuldades de se inserir no mercado de trabalho. Quando se colocam tendem a ganhar menos que homens brancos, nas mesmas funções, e a estarem expostas a jornadas triplas que as obriga ao trabalho remunerado fora de casa, cuidado com os filhos e filhas e com a casa. Abaixo das mulheres brancas estão os homens negros que além de terem muito mais dificuldades que homens brancos para arranjar empregos, tendem a ocupar funções subalternas de trabalho, bem como a ganhar menores salários, por conta do racismo que os exclui de oportunidades. Ademais, continuam expostos a todo tipo de violência racista e a um cruel genocídio, conforme se mostrará adiante. As mulheres negras estão na base da pirâmide social , tendo em vista que são as mais exploradas, por serem as que conseguem os piores empregos (quando conseguem), são também as que recebem as mais baixas remunerações (como empregadas domésticas, por exemplo), são as que precisam realizar os serviços domésticos e de cuidados com seus filhos e as que sofrem as piores humilhações devido ao fato de serem mulheres e estarem sujeitas a todo tipo de violência machista como o feminicídio, bem como pelo fato de sofrerem racismo, um sistema de negação de oportunidades e de discriminação. É importante notar que estas divisões presentes na classe trabalhadora são fundamentais para que o capital possa explorá-la de forma ainda maior e dominá-la de maneira mais eficiente, conforme ressalta a autora. Isto não significa, de forma alguma, que todos e todas devam buscar como parâmetro de luta os salários dos trabalhadores brancos, tendo em vista que estes, enquanto assalariados, também são explorados, embora menos explorados que as mulheres brancas e negras e homens negros. De acordo com Silvia Federici (2017, p.11): Rejeitamos a suposição de que o caminho para a libertação das mulheres seria ocupar os mesmos empregos fabris que os trabalhadores estavam recusando Tal sistema de opressões forjado na origem do modo de produção capitalista é constantemente reproduzido, a cada novo ciclo de produção do capital. Parece claro que este sistema de opressões requer uma resposta de luta coletiva contra todas as explorações. As lutas das mulheres negras podem fornecer uma resposta, tendo em vista que estes são os corpos em que as opressões de gênero, classe e raça entrecruzam-se. De acordo com Djamila Ribeiro, trata-se de compreender que o racismo não envolve apenas xingamentos ou atitudes individuais, ele é um sistema de opressão que nega direitos que reduz as oportunidades de homens negros e mulheres negras e desumaniza estas pessoas . Como dito anteriormente, Silvia Federici ressalta que o racismo foi principalmente construído e estabelecido durante o período colonial para justificar a escravização desses corpos e dividir a classe trabalhadora, conferindo superioridade aos brancos e brancas. Para Djamila Ribeiro, tendo em vista esta herança colonial de racismo, faz-se necessário confrontá-la em todos os aspectos, como o combate à negação de oportunidades de trabalho e de educação formal, a luta contra padrões de estética eurocêntricos que excluem o fenótipo negro, questionamentos de piadas e teorias que retroalimentam o racismo, bem como a derrubada de um sistema que privilegia brancos e brancas em detrimento de negros e negras, denominado branquitude . Segundo a autora, há que se lutar em todas estas frentes para desmantelar o racismo estrutural que nega humanidades, oportunidades e direitos aos homens negros e mulheres negras. A restituição de saberes e o reestabelecimento de epistemologias apagadas também precisam ser efetuados para que culturas produzidas por povos africanos, que foram propositadamente criminalizadas e invisibilizadas, voltem a ser enxergadas como saberes . Nomear opressões , reconhecer que estão interconectadas e que precisam ser combatidas em conjunto são percepções que as lutas contra a exploração devem assumir. As mulheres negras, por serem entrecortadas por todas as opressões, como as piores explorações de classe, de gênero e de raça são a materialização dos corpos mais afetados pelo sistema e que, portanto, possuem um lugar de extrema potência nas lutas. Assumir o ponto de vista das mulheres negras significa lutar contra a maioria das formas de exploração, quer dizer, portanto, pensar outras maneiras de organização social, outros marcos civilizatórios . Angela Davis também ressalta a importância de reconhecermos as diversas formas de opressão que estão postas no modo de produção capitalista, destaca a relevância de percebermos suas conexões e lutarmos contra elas de forma conjunta. Isto requer que todas e todos os trabalhadores reconheçam que são explorados e que um sistema que produz e reproduz explorações não pode significar liberdade . Assim, os trabalhadores brancos não podem se libertar sem a união com as trabalhadoras brancas, trabalhadores negros e trabalhadoras negras. Não há liberdade possível quando há opressão de um grupo, porque negar direitos a apenas uma pessoa significa colocar em questão o direito à uma vida plena a todos os seres humanos, já que todos e todas ficam em risco de serem oprimidos. Portanto, a luta contra a opressão requer o reconhecimento de que este é um sistema produtor e reprodutor de explorações que precisa ser combatido em conjunto pelos oprimidos e oprimidas . Desta forma, quando um trabalhador branco explora os corpos e trabalhos domésticos e de cuidados de mulheres está quebrando a sua própria libertação, pois rompe com a possibilidade de que suas companheiras se identifiquem com ele e lutem ao seu lado. O mesmo ocorre quando pessoas brancas pensam se beneficiar do racismo por possuírem privilégios em todas as áreas de suas vidas. Enganam-se, pois o privilégio social conferido à branquitude mina a possibilidade de união entre brancos e negros em um combate conjunto contra a opressão e pela construção da liberdade. Assim, entende-se, neste projeto, o nascimento do modo de produção capitalista como um sistema produtor e reprodutor de opressões que busca explorar os indivíduos através do roubo de seu trabalho, seja no âmbito do trabalho remunerado no caso homens brancos, mulheres brancas, homens negros e mulheres negras, seja no âmbito do trabalho (não remunerado) de reprodução da força de trabalho que recai sobre as mulheres (sobretudo sobre as mulheres negras), seja criando divisões na classe trabalhadora como o sexismo e o racismo. Considera-se de extrema importância que a Universidade pública acolha projetos que visem a entender de que forma o modo de produção existente produz e reproduz tais opressões.

Starting date: 2022-07-12
Deadline (months): 36

Participants:

Rolesort descending Name
Coordinator * Maria Cristina Longo Cardoso Dias
Student Doctorate * Isabela Alline Oliveira
Student Master * Domitila Morais Sana
Acesso à informação
Transparência Pública

© 2013 Universidade Federal do Espírito Santo. Todos os direitos reservados.
Av. Fernando Ferrari, 514 - Goiabeiras, Vitória - ES | CEP 29075-910